Jornais não morrerão, diz Arianna Huffington




Arianna é uma das vozes do InfoTrends 2011
São Paulo - Em entrevista exclusiva a INFO, a jornalista e empresária Arianna Huffington, 61 anos, conta detalhes da chegada do site de notícias The Huffington Post ao Brasil, fala sobre a importância das redes sociais e de como a internet está mudando a maneira como consumimos notícias. Leia, abaixo, a íntegra da conversa.
O tema da sua palestra no InfoTrends será “Como as mídias sociais têm revolucionado as comunicações”. A senhora já tem uma resposta para isso?

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    A comunicação agora acontece em duas mãos. O Will.i.am (um dos cantores da banda Black Eyed Peas e diretor da Intel), descreveu essa revolução de maneira muito interessante. Ele disse que, no passado, consumíamos informação sentados no sofá. E que hoje consumimos galopando num cavalo. Não lemos mais uma reportagem. Nós compartilhamos. As pessoas querem fazer parte da história, querem produzir conteúdo. Elas querem contar suas histórias.

    A senhora acredita que todo mundo pode assumir o papel de jornalista por causa do celular com câmera e do poder das redes sociais?
    Pode. A diferença é que você tem de ser confiável. O fundador do Craiglist, Craig Newmark, disse que a confiança é o novo preto. A pessoa pode ter acesso a uma plataforma de distribuição, pode ser ouvida. Mas ela é confiável?

    A reinvenção do jornalismo por causa de sites como o Huffington Post e o Wikileaks valorizou a internet como uma fonte confiável de informação?
    Quando a internet começou, era como uma adolescente. Ficava acordada até tarde, bebia muito, saía com todo mundo. À medida que a internet cresceu, vemos que ela se transforma numa coisa híbrida. Ela consegue reunir as melhores qualidades da mídia tradicional, como integridade, precisão, transparência. Mas também traz algumas das melhores características da nova mídia, como interatividade e a notícia em tempo real.
    A senhora acha que hoje o Huffington Post é mais importante do que um jornal tradicional, como o The New York Times?
    O nosso DNA é diferente. Estamos preocupados com a notícia em tempo real, com mídias sociais e com o engajamento das pessoas. Nascemos na internet. De uns tempos para cá, começamos a produzir mais conteúdo próprio porque temos um time maior de jornalistas. Mas precisamos ficar de olho: a mídia antiga está ficando cada vez mais online. Por outro lado, fazemos cada vez mais conteúdo próprio.
    O Huffington Post ficou conhecido por agregar notícias de fontes diferentes. Por que mudar um modelo bem sucedido?
    Não mudamos. Hoje fazemos tudo: agregamos conteúdo, temos milhares de blogueiros, acabamos de atingir 100 milhões de comentários, oferecemos conteúdo para milhões de pessoas. Ao mesmo tempo, somos uma empresa de jornalismo. Somos uma empresa híbrida. Para nós, não existe este ou aquele modelo ideal.
    A senhora acredita que, no futuro, sites como o Twitter serão a principal fonte de notícias das pessoas?
    Não. Sempre vai haver espaço para diferentes fontes de informação. Não acho que o jornal e a revista vão morrer. É uma coisa muito forte na nossa cultura. Gostamos de tomar um café folheando uma revista.
    Já há indícios de que usuários de redes sociais estariam cansados de sites como Facebook e Twitter. Qual é a próxima onda em redes sociais?
    Não acho que as pessoas estão cansadas. Acho que o que é cada vez mais importante para as pessoas é que elas consigam se desconectar das redes sociais. Elas precisam se conectar com elas mesmas. Vejo um desejo das pessoas de mudar de super conectados para desconectados uma parte do dia.
    As redes sociais podem ter um lado positivo, como vimos nos protestos no mundo árabe. Por outro lado, elas foram acusadas de incitar a violência em Londres. Qual é o verdadeiro papel das redes sociais quando o assunto é política?
    As redes sociais são uma força para o bem e para o mal. No mundo árabe, elas foram muito importante para as transformações que atingiram países como o Egito. No vandalismo de Londres, ela foi usada para acelerar a violência. As redes sociais estão aqui para ficar e sempre serão uma parte importante das nossas vidas. Estamos aprendendo a usá-las de forma mais responsável para que elas tenham um efeito positivo na sociedade.
    Os políticos e instituições terão de estar mais atentos e mais transparentes por causa de redes sociais? 
    Eles têm de ser mais responsáveis.
    Há países democráticos preocupados em controlar redes sociais e o acesso à internet?
    Acho que os países não democráticos estão mais preocupados. Eles tentam suprimir as redes sociais. Mas temos visto que, cada vez mais, elas conseguem driblar o controle.
    Em entrevista, o fundador do Gawker, Nick Denton, afirmou que o próximo desafio do site é fazer vídeos. Concorrer com redes de televisão é o futuro de publicações como o Gawker e o Huffington Post?
    Hoje as pessoas consumem televisão de forma diferente. As minhas filhas, que estão na faculdade, assistem aos seus programas preferidos no laptop. Elas podem abrir outras janelas e mergulhar em alguns assuntos. O consumo da televisão está mudando. Temos um grande investimento em vídeo, com estúdio onde produzimos conteúdo próprio. O vídeo é uma grande parte da nossa estratégia.
    O que a senhora vê como tendência, de futuro da internet?
    A internet ainda tem muito a crescer. Principalmente se comparado com a forma como as mídias impressas mudaram as coisas no passado. Hoje, a internet e as redes sociais afetam a forma como nos comunicamos, como interagimos, como nos divertimos, como os governos trabalham. Existem vários futuros possíveis. Um deles é um paradoxal. É aprender a desconectar. Na nossa redação, criamos salas onde as pessoas podem tirar sonecas no meio da tarde se estiverem cansadas. Temos um programa que ensina nossos funcionários a dormir melhor. Dizemos que eles não podem dormir com seus gadgets do lado da cama. Estamos todos sofrendo de uma falta de sabedoria. Precisamos ter certeza de que nos damos tempo suficiente para nos desconectarmos e sermos mais sábios. 

    A senhora acredita que estamos vivendo uma nova bolha na internet? Se estivermos, quais seriam as consequências dela?
    Estamos no meio de um crescimento muito grande de problema econômico. Se a economia continuar caindo, todas as áreas serão afetadas. Os nossos líderes acabaram de adotar as medidas corretas para fazer a economia crescer, para criar novos empregos. Estamos pagando um preço caro como resultado dessa política.
    O que as empresas.com precisam fazer para evitar a bolha?
    Acho que temos muitas empresas de internet estáveis, num estágio muito maduro. Muitos sites estão totalmente integrados com a economia.
    O Huffington Post está vindo para o Brasil?
    Sim. Estamos na fase de identificar editores e parceiros. Estamos muito animados com a chance de ir para o Brasil. É um período muito bom para investir no país. As redes sociais são uma grande parte da comunidade, as pessoas consomem conteúdo de uma forma muito avançada. É uma grande oportunidade.
    Tem data para isso?
    Até o final do ano.
    E qual será o modelo de negócio?
    O mesmo. Vamos fazer as mesmas coisas que fazemos aqui. São os mesmo quatro elementos: agregação, blogs, comentários e reportagens próprias. A receita virá de um modelo baseado em anúncios.
    Como o mercado brasileiro se diferencia do americano?
    Com a ascensão da nova classe média, tem muita oportunidade. Tem cada vez mais gente usando a internet, as redes sociais. Estou seguindo o comediante Rafinha Bastos e acho incrível ele ter tantos seguidores. Adoro a forma como pessoas comuns conseguiram encontrar uma voz. Quando os traficantes invadem favelas a comunidade ganha um jeito de falar as coisas. Esse é um exemplo incrível do uso das redes sociais.
    Com a crise econômica nos Estados Unidos e na Europa, qual é hoje o papel de países emergentes como China, Brasil e Índia na internet?
    O Brasil está vivendo o sonho americano, mais dos que os americanos estão. Existe uma mobilidade social para cima no país, enquanto aqui está acontecendo no caminho contrário. Temos mais de 100 milhões de pessoas que estão numa situação pior do que a que encontravam os seus pais.

    O que mudou na sua vida desde a venda do Huffington Post para a AOL?
    Não muita coisa. Ainda sou a diretora de redação dos nossos 50 sites, como o Huffington Post. Meu papel muito editorial. Só ficou muito maior, tenho mais responsabilidades.
    A senhora já disse que costuma se separar dos seus BlackBerrys quando vai dormir. Levar o Huffington Post para outros países não faz com que essa tarefa seja mais difícil?
    É sempre possível desligar. É assim que você recarrega as baterias e se torna uma pessoa melhor. Se você não consegue recarregar a energia você não consegue tomar as decisões certas.
    Fonte:
    Por Gustavo Poloni, de INFO
     
    • Terça-feira, 30 de agosto de 2011 - 20h42